Editar poesia é um
mau negócio
Neste género, as
tiragens rondam os 500 exemplares e só os grandes nomes chegam aos 2000. Para
as editoras, é uma questão de prestígio. E de tentar não perder muito dinheiro.
Poesia não dá
dinheiro - nem aos autores nem aos editores. Jorge Reis Sá, que é poeta e
editor sabe isso como ninguém. Mas esta evidência não o faz desistir. Se a
poesia é, como disse Eugénio de Andrade, "a festa suprema da língua",
tem de valer a pena partilhá-la, mesmo que seja para uma elite, para um nicho
de mercado, para umas poucas centenas de leitores.
"Se vir isto
pelo lado do negócio, que também o é, para uma editora de média dimensão como a
nossa editar poesia é desastroso. Precisávamos vender muito mais para que
conseguíssemos pagar as contas", explica Zeferino Coelho, editor da
Caminho. Hugo Xavier, da Portugália, confirma: "Editar poesia não é bom
para o negócio." "Quem só se rege pelo lucro não edita poesia",
diz Reis-Sá.
Uma obra de poesia
tem uma tiragem média de 500 exemplares - o suficiente para conseguir colocar
livros nas principais livrarias que existem pelo país. Mas desses vendem-se
mais ou menos 200. É muito pouco. A Caminho, que edita poesia portuguesa ou de
autores que escrevem em português, consegue fazer tiragens de 1000 exemplares,
mas Zeferino Coelho reconhece que este é um número "um pouco
exagerado". A Dom Quixote edita apenas dois ou três livros de poesia de
ano mas como aposta em autores consagrados e premiados pode ir até aos 1500 ou
2 mil exemplares. Um sucesso para poetas como Miguel Torga, Manuel Alegre,
Fernando Pinto Amaral, Nuno Júdice, António Nobre ou Ramos Rosa. "Faço
questão de ter todos os anos alguns livros de poesia, mas mais do que isto é
impossível", admite a Cecília Andrade. "A poesia é importante para a
editora mas não pelas vendas. Quando, de vez em quando, temos uma segunda edição
ficamos muito contentes."
Edições de 2, 3 ou 4
mil exemplares são raras. Acontecem, por exemplo, com Sophia de Mello Breyner
(na Caminho), José Luís Peixoto ou José Régio (na Quasi), com Fernando Pessoa,
Rimbaud, Lorca, Blake, Yeats, Hölderlin, Pablo Neruda (na Relógio D'Água), com
Cesariny, Alexandre O'Neill ou Herberto Helder (na Assírio e Alvim). "São
as excepções", comenta Jorge
Reis-Sá.
Num país onde todos
têm a pretensão de saber alinhar uns versos e onde muitos livros de poesia
aparecem, ainda hoje, no mercado com edições de autores, pagas pelo próprio, as
grandes editoras não desistem da "festa da língua".
Apesar de não dar
dinheiro, todos estes editores insistem em publicar poesia. Talvez porque o
negócio dos livros não seja, afinal, um negócio como os outros. Há o prestígio.
Há a noção de dever. De serviço a cumprir. Um acto de resistência. Uma vontade
de "honrar uma marca histórica", como diz Hugo Xavier, da Portugália.
E, se paticamente não
há lucros, os editores preocupam-se em, pelo menos, não ter grandes prejuízos.
Aproveitam as novas tecnologias e utilizam a impressão digital o que permite reduzir consideravelmente os
custos em tiragens até 750 exemplares.
Para cativar os
leitores, as editoras organizam antologias e reúnem obras completas - como fez
a Dom Quixote com a obra poética de Maria Teresa Horta, já nas livrarias,
disponibilizando títulos que se encontram esgotados há imenso tempo.
Apostam em valores
seguros, editam sobretudo os nomes consagrados, privilegiam os autores que já
pertencem à casa. Neste cenário, os novos poetas têm a vida dificultada,
explica Francisco Vale, da Relógio D'Água. "Mesmo na comunicação social, a
poesia tem cada vez menos espaço e menos atenção. Só se dá atenção ao que já
sabemos que vai ter sucesso, o que torna cada vez mais difícil lançar novos
nomes."
Vale a pena? Todos
dizem que sim. De tal forma que a histórica Guimarães pretende retomar este ano
a publicação de poesia, recuperando a colecção "Poesia e Verdade"
(com novos autores) e recuperando os clássicos da chancela da Ática.
"Embora a tenhamos a preocupação de termos sustentabilidade económica, não
só isso que nos orienta", explica Vasco Silva. "Queremos acrescentar
um valor, não só económico mas cultural."
https://www.dn.pt/artes/livros/interior/editar-poesia-e-um-mau-negocio-1177433.html
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